Quem semeia ventos, colhe tempestades

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Surge, no início, como um aperto no peito que desfaz e torce o coração como uma toalha molhada num dia frio e húmido. Persegue-nos infinitamente até ao momento em que nos deitamos no escuro e olhamos o ar vago perguntando-nos onde haveremos de ter errado, onde terá acontecido o erro que nos propulsionou a esta desgraça.

Ninguém sabe o vazio de um coração até o sentir; e eis que mundo ordinário como este julgará todos estes momentos como nada mais que pinturas externas das histórias românticas de que tanto fugimos e que nos banham diariamente as infantilidades do dia-a-dia, impossíveis de se viver, ladeadas de mentiras belas suficientes para nos cercarem de ilusão. Até o sentirem, a dor de sentir aquele espaço vago entre o sentimento e a saudade; até sentirem o seu ardor inconstante, ninguém o sabe, nem o saberá até que dor essa lhe corra pelas veias e lhe suba pela sangue até ao cérebro. Ninguém sabe.

E podem julgar e apontar dedos e citá-la como ridícula ou inóspita; verdade é essa que ela existe e atormenta as mentes mais puras que nada mais que um bem universal desejam; e espelham seu esforço nos olhos tingidos de um ardor inefável que escondem nos acontecimentos secretos do dia-a-dia. Verdade é essa a que se esconde nos olhares alheios e nos braços trémulos de quem deseja o bem e embebe o mal nas suas mãos trémulas e cansadas de uma tristeza desconhecida.

O bem, esse, esconde-se por entre as ervas daninhas da vida e se disfarça por entre as ervas verdes que pintam os prados da cor da inveja e matam os bichos alegres que nos alimentam a terra. O bem esconde-se por onde não pode ser encontrado e é esmurrado e espancado porque ninguém se apercebe de onde ele está. O bem infiltra-se nas situações e nos momentos em que não deverá existir ou presencias, apenas deverá ser procurado. Do bem, ninguém sabe dele. E os outros que o procurem sem o êxtase que ele próprio encontra ao sorrir e ao segurar essa mão alheia que não o reconhece e o pinta como o malvado. Esse que anda aí, e lacrimeja as verdades que todo o restante mundo se recusa a sentir por si.

Ela pinga sobre a pedra da calçada que vai pisando languidamente e sente essa dor escondida dos corações palpitantes que sentem e sentem tudo e os sentimentos como uma pedra que se infiltra no calçado do homem vagabundo que procura nada mais do que a felicidade.

Não recorram a ela como quem precisa de favores últimos e não sabe achar as verdades nos recantos mais reconhecidos de sua juventude, ou se deixa conduzir por banalidades inexistentes de uma mente sã e material que nada mais quer que o seu próprio conforto, bastante anterior a qualquer outra sensação universalizante da boa-ventura. Não a tomem por garantida. Para sempre estará ela sob uma dúvida divina ou humana de suas qualidade enquanto confiante de tais instintos. Para sempre deveria ela ser duvidada enquanto é ela mesma tida como uma garantia irredutível. Pois sua confiança não se compra a troco coisa barata, mas cara também não o é. O segredo, sempre e sempre, permanece em palavras mágicas escondidas entre os infinitos disfarçados de embriaguez. E nada mais vos custará.

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